O que é o aparte no júri?



O que é o aparte no júri?

É sabido que o plenário do tribunal do júri abriga um dos maiores fenômenos do exercício da advocacia criminal, que são os debates orais, ocorrido na arena das palavras. Este acontecimento é o ponto culminante do processo que julga os crimes tentados ou consumados contra a vida pois, diante de juízes leigos que não conhecem a dogmática jurídica, terão de recontar uma história segundo a tese que defendem, apresentando-lhes as razões pelas quais crêem que o réu cometeu ou não determinado crime.

Como dizia Alfredo Tranjan, de todos os oradores, padres, pastores, professores entre outros, a espécie “orador de júri” se destaca pelo fato de ter sempre diante de si o olhar atento, a atenção focada e a presença ferina do seu oponente, enquanto aqueles não têm adversário enquanto falam.[1]

Nessa circunstância, a figura do aparte se sobressai como ato diferenciador, que ocorre com maior ou menor frequência, dependendo do estilo adotado pelos oradores. Mas, que é o aparte? Ora, aparte nada mais é que a intervenção oral, por meio de afirmação ou indagação, que um debatedor faz no momento em que o outro fala, com o objetivo de esclarecer questão de fato ou de direito ou mesmo confundir a parte contrária, quebrando-lhe o raciocínio.

Costumeiramente, o aparte era realizado por meio de solicitação que se fazia à própria parte contrária, como por exemplo: “Vossa Excelência me permite um aparte?”, ao que lhe seria concedido ou não. Mas havia também, com razoável ocorrência, o aparte realizado sem solicitação, onde o debatedor apenas intervinha de inopino na fala de seu adversário.

A lei nº 11.689/08, com o objetivo de trazer um pouco mais de ordem na utilização dos apartes, que muitas vezes se tornavam bate-bocas, algo que feria a liturgia própria do momento da sustentação oral e a compreensão dos jurados sobre o fato, introduziu o inc. XII ao art. 497, que diz que cabe ao juiz presidente do tribunal do júri “regulamentar, durante os debates, a intervenção de uma das partes, quando a outra estiver com a palavra, podendo conceder até 3 (três) minutos para cada aparte requerido, que serão acrescidos ao tempo desta última.”

Portanto, hoje, de regra, o orador deverá solicitar ao magistrado o aparte, que poderá concedê-lo em até três minutos (pois não deve este procedimento se tornar verdadeira sustentação oral), tempo este que será acrescido para aquele que foi interrompido.

Apesar do que diz o CPP, RANGEL entende que o aparte deve ser concedido pela parte, não pelo juiz. Com ele concordamos. Explicando ainda a dinâmica, diz o autor carioca que existe o aparte consentido e o aparte autorizado. O primeiro “será aquele em que o orador permite que seja realizado, sem que necessite da intervenção do juiz.” No entanto, e aqui nasce o aparte autorizado, “caso haja negativa do orador e intervenção indevida da outra parte, o juiz, se provocado e achando pertinente, intervém autorizando o aparte e concedendo o prazo de três minutos à parte que deseja falar e que serão acrescidos à fala do orador que foi interrompido”[2].

Importante esclarecer que o acréscimo de tempo de fala só será realizado quando ocorrer o aparte autorizado, não o consentido.[3]

O juiz, ao conduzir os trabalhos, deve estar ciente que poderão ocorrer apartes, o que é normal, cabendo-lhe manter sempre a ordem da sessão, pois não pode aquele momento se tornar uma completa balbúrdia que só atrapalharia.

Apartes devem ocorrer com respeito mútuo, sob a régua da boa-fé, sem intervenções inócuas. Claro que deverá ocorrer com firmeza, mas sem descambar ao insólito.

Os apartes são importantes, pois são capazes de clarear um ponto sombrio, ou mesmo retirar a credibilidade do orador que se assenta sobre um fato que não corresponde a qualquer prova dos autos, evitando, assim, que os jurados sejam vítimas da pura retórica.

Por fim, advogado e promotor, no júri, utilizam armas idênticas, na lição de TRANJAN. “Chamam-se lucidez, raciocínio e lógica. São o florete e o punhal do espadachim”, em outras palavras, “o elegante florete do discurso e o temido punhal do aparte.[4] (grifou-se)



[1] TRANJAN, Alfredo. A beca surrada – meio século de foro criminal. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1994, p. 246.

[2] RANGEL, Paulo. Tribunal do júri – Visão linguística, histórica, social e jurídica. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 240, livro digital.

[3] Idem, ibidem.

[4] TRANJAN, p. 246

Por: Jimmy Deyglisson é advogado criminalista, vice-presidente da ABRACRIM/MA, especialista em ciências penais e ex-policial civil.


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