Alteração de advogado e novo interrogatório



Alteração de advogado e novo interrogatório

O interrogatório, como é sabido, constitui-se como meio de prova e meio de defesa (autodefesa), “aberto à conveniência do acusado e seu defensor[1]. Na atual estrutura do processo penal pátrio é o último ato da instrução, a fim de conferir ao réu a possibilidade de rebater, em ampla defesa, toda a carga acusatória que lhe é dirigida.

              Ocorre que após o interrogatório poderá surgir fato novo, de conhecimento público e notório, ou que dele tenha conhecimento a defesa, que implicará a necessidade de se ouvir novamente o réu. Mas esta oitiva não é um direito subjetivo que lhe cabe, motivo pelo qual só poderá ser realizado pelo juízo, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público ou do acusado, e, claro, antes das alegações finais. Esta é a exata inteligência do art. 196 do CPP: “Art. 196. A todo tempo o juiz poderá proceder a novo interrogatório de ofício ou a pedido fundamentado de qualquer das partes.

              Esta redação foi introduzida pela Lei nº 10.792/03, quando o interrogatório ainda era o primeiro ato da instrução. Queria o legislador, com esta mudança, permitir que a oitiva do réu se repetisse, caso durante a oitiva de testemunhas surgisse fatos ou circunstâncias novas. A redação perdeu um pouco de sentido após a Lei 11.719/08, que levou para o final da instrução a oitiva do acusado. No entanto, há uma hipótese interessante a se debater.

              Um fato novo pode ser entendido como a renúncia do advogado aos poderes que lhe foram conferidos, ou a revogação de tais poderes por parte do acusado, ou até mesmo o substabelecimento a outro causídico. Este profissional, em tese, foi o que instruiu o réu durante todo o processo e, principalmente, durante o interrogatório, a respeito de se deveria ou não permanecer calado, o que deveria calar, ou as informações que deveria prestar.

              Nesta alteração de advogados, portanto, se entenderia que o réu foi prejudicado, já que o segundo causídico tinha compreensão diversa do primeiro, no que pertine à estratégia durante o interrogatório. Assim, nasceria a necessidade de ser o réu ouvido novamente, invocando a aplicação do art. 196 do CPP, citado.

              Não é desta forma, todavia, que o STF julga, mesmo que no primeiro interrogatório tenha o acusado permanecido calado. A corte suprema entende que nestes casos deve-se provar o prejuízo da não realização de nova oitiva após a mudança de advogados. Veja-se:

 

INDEFERIMENTO –  “Agravo regimental em habeas corpus. Interrogatório. Direito ao silêncio. Alteração de advogado. Pedido de novo interrogatório. Art. 196 do CPP. Faculdade do juízo. Indeferimento. Alegação de nulidade. Ofensa aos arts. 5º, LIV e LV. e 93, IX, da CF. Não ocorrência. Agravo regimental a que se nega provimento. I – O art. 196 do Código de Processo Penal – CPP, na redação conferida pela Lei nº 10.792/2003, faculta ao juízo a realização de novo interrogatório, de ofício ou a pedido das partes. O dispositivo, contudo, perdeu importância com o advento da Lei nº 11.719/2008, haja vista que, nos termos do art. 400 do CPP, o interrogatório passou a ser efetuado ao final da instrução processual. II – No caso, o paciente foi interrogado sob a égide da nova legislação e na presença do respectivo patrono, tendo ele optado por permanecer em silêncio. A alteração de advogado, por si só, não é apta a fundamentar a realização de novo interrogatório. Incidência da Súmula nº 523 /STF. III – Encontra-se motivada a decisão que indeferiu o pleito de renovação do interrogatório sob o argumento da preclusão consumativa e do prejuízo à marcha processual, uma vez que a ação penal já estava na fase de alegações finais. IV – Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF – Ag Rg-HC 138.121 – Rio de Janeiro – 2ª T. – Rel. Min. Ricardo Lewandowski – J. 16.10.2017)RDP+107+2018+DEZJAN+183 (grifou-se)



[1] DE OLIVEIRA, Eugenio Pacelli; FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Penal e sua jurisprudência. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 374, livro digital.

Por: Jimmy Deyglisson é advogado criminalista, vice-presidente da ABRACRIM/MA, especialista em ciências penais e ex-policial civil.


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