Posso confessar o crime em Delegacia?



Posso confessar o crime em Delegacia?

A confissão é um meio de prova admitido em nosso ordenamento jurídico, prevista e regulado nos art. 197 a 200 do Código de Processo Penal. Confessar, segundo NUCCI[1], “é admitir contra si, por quem seja suspeito ou acusado de um crime, tendo pleno discernimento, voluntária, expressa e pessoalmente, diante da autoridade competente, em ato solene e público, reduzido a termo, a prática de algum fato criminoso”.

              Ainda no escólio do mesmo jurista, a confissão não deixa de ser um testemunho, pois equivale a um depoimento sobre algo visto ou ouvido em relação ao fato penal, porém, aqui, as declarações ditas são em desfavor de quem as faz, diferentemente do que ocorre com a testemunha normal[2]. Ela, confissão, é reconhecida como circunstância atenuante genérica, a teor do art. 65, III, d, do Código Penal.

              A confissão não se confunde com qualquer admissão de prática criminosa. Aliás, “é incorreto dizer que alguém, não suspeito, nem acusado pelo Estado, ao admitir a prática de um fato considerado criminoso, está confessando. Na realidade, nessa hipótese, trata-se da autodenúncia ou autoacusação[3].

              Como se trata de meio de prova delicado, com todas as exigências acima ditas, o art. 197 do CPP nos alerta que seu valor “se aferirá pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e para a sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo, verificando se entre ela e estas existe compatibilidade ou concordância”.

              Em outras palavras, a confissão, sozinha, alijada de outros elementos probatórios, não consegue acobertar uma sentença condenatória. É necessário que ela coexista no processo, em congruência lógica, com outras provas.

Portanto, uma vez que a confissão guarda a característica de beneficiar o réu em termos de diminuição da reprimenda estatal, ao passo em que é intrinsicamente desfavorável ao réu (pois admitir um crime é reconhecer a necessidade da pena, e uma pena justa só pode vir após e por meio do processo), confessar simplesmente porque deu vontade, sem os pressupostos de validade sem os quais a confissão não tem força de prova, não é o melhor caminho.

              No conceito trazido por NUCCI, a solenidade, a autoridade competente, a voluntariedade e o discernimento são atributos da confissão enquanto prova do processo penal. Desrespeitar estes elementos é prejudicar o réu. Veja-se que uma confissão mal realizada pode ensejar, pelo Ministério Público ou pelo Delegado de Polícia, até mesmo a suspeita e posterior imputação de um outro crime, pois pode interpretar erroneamente as palavras do leigo, ditas no insólito ambiente da delegacia.

Ademais, perante o Delegado, a confissão só tem legitimidade se realizada novamente e posteriormente em juízo, o que equivale a dizer que nada do que foi dito antes no interrogatório policial tem tanta validade como se espera. Assim é a prática.

              Não se está querendo dizer que, no interrogatório policial, todas as vezes o investigado permanecerá calado. Não. Tão somente deve o advogado e o cliente terem redobrada cautela caso a intenção seja a confissão, que, consoante explanado, não se recomenda seja realizada em Delegacia. Respondendo à pergunta do título: pode, mas não deve!


[1] NUCCI, Guilherme de Souza. O calor da confissão como meio de prova no processo penal. 1ª ed. Saraiva: 1997, p. 76.

[2] NUCCI, 1997, p. 77.

[3] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 15 ed. São Paulo: Forense, 2016, p. 303, livro digital. 

Por: Jimmy Deyglissono é advogado criminalista, vice-presidente da Abracrim/MA, especialista em ciências penais e ex-policial civil.


8 comentários

  1. Paulo Jessé Mendes Barbosa disse:

    Confessar a prática de um ilícito penal, é pedir expressamente a punição. NUNCA é aconselhável a confissão, principalmente em “SEDE” policial. Certo que a confissão é uma poderosa “atenuante” da reprimenda, mas, em contrapartida, enfraquece “de morte” a tese da defesa.
    EXCELENTE,
    EXCELENTE MESMO o texto abordado.
    PARABENIZO aos idealizadores …!!!

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