O que é o recurso por cota? Quando poderei utilizá-lo?



O que é o recurso por cota? Quando poderei utilizá-lo?

O recurso por cota nos autos é a manifestação manuscrita ou digitada da parte sucumbente que lança breve requerimento, em folha contida nos autos, de sua intenção de recorrer. Apesar de não estar previsto em lei, muito comum foi sua utilização em processos cíveis e criminais. Atualmente, quase não se vêm recursos manejados desta forma, porém, é de se perguntar: ainda é possível o recurso interposto por cota nos autos?

              Em primeiro lugar, necessário esclarecer que esta prática só é possível nos recursos em que a interposição pode ser separada das razões, como por exemplo, apelação criminal e recurso em sentido estrito. Isto porque a cota equivale justamente à interposição do recurso e, naqueles onde as razões já devem vir acompanhadas da interposição, haveria impossibilidade instrumental, pois não seria viável a fundamentação do recurso realizar-se por meio de cota.

              Em segundo lugar, para que possa valer a interposição do recurso por cota, necessário que seja aposta aos autos quando se abrir vista à parte ou for ela intimada da decisão impugnável. Agir fora desse momento seria incorrer na objeção legal contida no art. 202 do CPC, aplicado por analogia ao CPP, onde se afirma que “é vedado lançar nos autos cotas marginais ou interlineares, as quais o juiz mandará riscar impondo a quem as escrever multa correspondente à metade do salário-mínimo.” Ainda, se não houver tal rigor, a parte poderá se manifestar a qualquer momento, inclusive fora do prazo legal, dificultando saber se foi o ato tempestivo ou não[1].

              A finalidade desta proibição é impedir que os autos se tornem uma celeuma de anotações, sem ordem e sem organização, impedindo que o processo tenha seu andamento escalonado, facilitando o entendimento de quem nele se manifesta. Ademais, como após a aposição da cota a secretaria deverá promover a intimação da parte para apresentação das razões recursais, não se deve permitir fazê-lo em qualquer momento e de qualquer forma.

              Assim, manifestar-se por cota fora do momento processual adequado é incorrer na oposição legal insculpida no art. 202 do CPC. Assente-se que até o mesmo o réu pode interpor o recurso por meio de cota de próprio punho, consoante jurisprudência:

 

“APELAÇÃO CRIMINAL POR COTA DO PRÓPRIO PUNHO DO RÉU         CONDENADO. FALTA DE RAZÕES. DEFENSOR NÃO INTIMADO. NULIDADE. CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS DE OFÍCIO. NULO O DESPACHO DO JUIZ QUE AO RECEBER O RECURSO POR COTA NOS AUTOS INTERPOSTO PELO PRÓPRIO RÉU, DETERMINA VISTA DIRETA AO PROMOTOR DE JUSTIÇA PARA CONTRA-RAZÕES, SEM QUE ANTES TENHA OFERECIDO OPORTUNIDADE PARA O DEFENSOR OFERECER RAZÕES. (TJ-SC-ACR: 361755 SC 1988.036.175-5, relator: Rogerio Lemos, Data de julgamento: 26/04/1990, Segunda Câmara Criminal, Data de publicação: DJJ: 8.010DATA 14/05/1990PAG: 04)” (grifou-se).

              O STJ já se manifestou aceitando o recurso por cota interposto pelo Ministério Público, considerando tal fato mera “filigrana processual” incapaz de macular a aceitabilidade da irresignação:

 

RECURSO ESPECIAL Nº 62.760-5 – RS (Registro nº 95.0014448-4)

Relator: O Sr. Ministro Adhemar Maciel Recorrente: Nélson de Aquino Silveira Machado Advogado: Dr. Nélson de Aquino Silveira Machado Recorrido: Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul

EMENTA: Processual Penal. Homicídio tentado. Recurso do Ministério Público por meio de cota. Possibilidade já que o Juiz, a quem é endereçado o preceito do caput do art. 578 do CPP, o admitiu. Prescrição. Inexistência, uma vez que a prescrição, quando não há trânsito em julgado, se regula pela pena máxima cominada em abstrato. Recurso especial não conhecido. I (…) lI – O caput do art. 578 do CPP é endereçado ao juiz. Assim, se ele aceita recurso por cota nos autos, não se tem como anular o processo por mera “filigrana processual”. (…). (grifou-se)

 

              Assim, caso o advogado esteja presente no fórum ao final do expediente forense e no último dia do prazo para interposição do recurso, bem como não tiver como digitar e imprimir uma petição, poderá se valer da cota para não deixar precluir seu direito de recorrer.



[1] BADARÓ, Gustavo Henrique. Código de Processo Penal Comentado. 1 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018, p. 1.072.

Por: Jimmy Deyglisson é advogado criminalista, vice-presidente da ABRACRIM/MA, especialista em ciências penais e ex-policial civil.


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